15 agosto 2014

Em caso de flagrante, maioria dos juízes opta pela prisão preventiva

Primazia das grades

Em caso de flagrante, maioria dos juízes opta pela prisão preventiva

A maioria dos juízes, ao analisar casos de prisão em flagrante, opta por determinar a detenção preventiva, aponta o estudo SOS Liberdade, produzido pelo Instituto de Defesa do Direito de Defesa com o intuito de sondar o impacto da Lei 12.403/11 (Lei das Cautelares) nas decisões judiciais em São Paulo.
Segundo a pesquisa, de 344 decisões judiciais analisadas, 171 converteram a prisão em flagrante em prisão preventiva (49,71%), 154 aplicaram medida cautelar alternativa à detenção (44,77%) e em 18 casos o acusado foi colocado em liberdade plena (5,23%).
O argumento mais utilizado para fundamentar a prisão preventiva, ainda de acordo com o levantamento, é a garantia da ordem pública (36%), seguido da conveniência da instrução criminal (29%) e aplicação da Lei Penal (19%).
Após a denúncia ser oferecida e o processo encaminhado para o fórum criminal da Barra Funda, dos 171 casos de prisão preventiva, 57 tiveram a medida mantida (33,33%). A liberdade provisória sem fiança foi concedida em 32 ações (18,71%) e medida cautelar alternativa à detenção em 17 (9,94%).
Para sustentar a decisão, o Judiciário alegou, entre outros motivos, a existência de antecedentes criminais ou reincidência (16%); falta de vínculo com o distrito de culpa (7%); personalidade voltada à prática delitiva; ausência de ocupação lícita (6%); e indícios da autoria e materialidade do delito (6%).
Segundo Augusto de Arruda Botelho, diretor presidente do instituto, esse cenário desenhado pelo levantamento demonstra que a Lei 12.403/11 “não pegou”. “Juízes não a aplicam, defensores públicos a deixam de lado e tribunais fecham os olhos para evidentes ilegalidades”, escreveu, na introdução do relatório.
Regra e exceção
Sancionada em maio de 2011, a Lei 12.043/11 altera dispositivos do Código de Processo Penal referentes à prisão processual, fiança, liberdade provisória e medidas cautelares. Segundo seu parágrafo 6, do artigo 282, “a prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar”.
Mais adiante, no artigo 319, o dispositivo lista as diferentes modalidades de medidas cautelares, como comparecimento periódico em juízo; proibição de acesso ou frequência a determinados lugares, de manter contato com determinadas pessoas e de ausentar-se da comarca.
O criminalista e presidente da Academia Paulista de Direito Criminal, Romualdo Sanches Calvo Filho, tem visão similar à de Arruda Botelho. A lei não está sendo aplicada como deveria, diz ele, "mas como querem alguns incautos e afoitos magistrados, no afã desabrido de agradar a opinião pública, a qual vê na prisão a panaceia de todos os males”.
“Infelizmente, no Brasil, a regra é a manutenção ou decretação de prisão cautelar, nomeadamente a temporária e a preventiva, quando deveria essa medida drástica ser a exceção”, acrescenta Calvo Filho.
O também criminalista Alberto Zacharias Toron, do escritório Toron, Torihara e Szafir Advogados, acredita que os resultados do relatório são fruto do “amor” que o juiz tem pela prisão preventiva. Ele compara a situação a de um médico que tem o mesmo remédio para diversas doenças e acrescenta que a lei vai na contramão do momento punitivista pelo qual passa o Judiciário.
Já o promotor de Justiça em Minas Gerais, André Luis Alves Melo, afirma que a prisão ocorre porque "se [o acusado é] solto, a defesa começa a ‘enrolar’ o processo para dar prescrição”.
Para Melo, a solução seria acabar com a prescrição — “assim não adiantaria a defesa enrolar o processo e recursos” — e com a obrigatoriedade da ação penal, permitindo ao Ministério Público propor acordos de pena alternativa.
“Com essas medidas, haveria uma substancial diminuição do prazo e dos processos, bem como das prisões, mas há setores que lucram com a demanda processual e não querem mudanças efetivas”, prossegue.
Perfil dos presos
O relatório também traça um perfil dos 537 presos em flagrante atendidos por um mutirão do instituto, entre novembro de 2011 e julho de 2012, no Centro de Detenção Provisória de Pinheiros (zona oeste da capital paulista).
A maioria dos entrevistados tem entre 25 e 34 anos (42%), com ensino fundamental incompleto (40%) e renda de um a três salários mínimos (45%). Em relação à cor de pele, 41% declararam-se pardos, 39%, brancos, e 18%, pretos.
Sobre os motivos da detenção, o relatório afirma que cerca de 60% foram presos por furto simples e 12% por furto qualificado, segundo os próprios detentos. Já de acordo com o prontuário, o furto simples figura no topo da lista, com 30%, seguido pelo furto tentado (28%) e receptação (18%).

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Uso do laudo psiquiátrico no caso Pesseghini: a criminalização da criança pela loucura

Publicado originalmente no Desmilitarização da Polícia e da Política do DF, em 9 de julho de 2014.

Criança louca mata família inteira e se mata em seguida. Essa foi a narrativa proposta pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, no início do mês de junho passado, quando pediu o arquivamento do inquérito sobre a morte da família Pesseghini, ocorrida em 5 de agosto de 2013. Uma das principais provas elencadas no inquérito para apontar Marcelo, de 13 anos, como autor dos crimes é o laudo psiquiátrico póstumo do menino: nele, Marcelo é comparado a Dom Quixote, pois em seu inconsciente “a imaginação e a realidade se misturam morbidamente”. Apontado como portador de “delírio encapsulado” devido a uma “encefalopatia” causada por falta de oxigenação no cérebro, Marcelo teria sido influenciado por jogos de computador para matar a tiros seu pai e mãe – ambos policiais –, avó e tia-avó e depois se suicidar.
Apesar da versão mais noticiada do caso responsabilizar o garoto pelas cinco mortes desde o início das investigações, as controvérsias que rondam o crime são variadas. Entre o assassinato dos familiares durante a noite e seu suposto suicídio, Marcelo teria dirigido o carro da mãe até a escola, dormido dentro do veículo e comparecido à aula na manhã do dia seguinte. Retornaria depois de carona à casa, onde se mataria. Segundo seus avós paternos, Marcelo não sabia atirar nem dirigir, e tinha uma relação amorosa e tranquila com toda a família. Era uma criança pequena e, sendo ainda portador de fibrose cística, dificilmente teria a força e destreza necessárias para atirar na cabeça de quatro adultos com precisão, sem ser por eles contido – especialmente considerando que seus pais eram policiais experientes. Os parentes ainda sustentam que as hipóteses de vingança ou queima de arquivo não foram suficientemente exploradas. Por isso, contrataram advogada especialista em perícias para contestar a versão da polícia e, em 5 de junho, conseguiram que o inquérito não fosse arquivado como pedido pelo MPSP, mas remetido à vara da Infância e Juventude de São Paulo para novas diligências.
Para além dos embates entre teses investigativas, uma questão se coloca: mesmo que Marcelo seja culpado, a utilização do exame psiquiátrico como prova conclusiva permite que se julgue outra coisa, que não o crime. O exame aponta que o “quadro de delírios” de Marcelo teria se agravado em 2013, quando ele teria passado a dizer que queria se tornar um “justiceiro”, um “matador de aluguel de corruptos”, inspirado no jogo “Assassin’s Creed”. Marcelo teria trocado sua foto de perfil em uma rede social por imagem de personagem do jogo um mês antes da morte da família. Em outras fotos, aparece usando um gorro que seria semelhante ao de outro personagem do mesmo jogo. Nenhuma dessas condutas é, obviamente, um crime. Tampouco têm qualquer relação com a morte da família, mas ainda assim são consideradas evidências relevantes para o processo penal em curso. Enunciar essas características como determinantes sobre quem é Marcelo no contexto de uma investigação criminal opera um deslocamento sobre o que se julga: já não se trata de investigar o delito, mas de analisar o ser que supostamente o comete. Sendo uma criança, o dobramento que se faz entre o crime e o sujeito é ainda mais perverso. Suas condutas, gostos e desejos são reprovados moralmente – como se adulto fosse – e se colam ao crime: Marcelo não é só a criança que morreu, Marcelo é a criança suspeita, de personalidade perigosa e delirante.
Um laudo psiquiátrico não tem por função concluir sobre a autoria de crimes. No Código Penal, o exame de sanidade mental é previsto para a avaliação da imputabilidade, ou seja: para aferir o grau de compreensão da ilicitude do ato que o sujeito poderia ter, em face de possíveis transtornos mentais. Assim sendo, tal exame só faz sentido se já se concluiu que o sujeito cometeu um ato criminoso, já que é preciso a existência de um delito e de um agente que o causou para questionar se é possível puni-lo. No caso da família Pesseghini, o laudo é posicionado de outra forma: opera para criar o nexo causal entre Marcelo e as mortes, para pôr em evidência aquilo que, na personalidade do menino, já seriam as condições de possibilidade de um crime futuro. Como se pôde fazer um laudo de uma criança morta, para chegar até essa conclusão? O exame se baseia no resgate de eventos aleatórios da vida para provar a perversão de um menino que já não está. Ao final, o exame psiquiátrico afirma que Marcelo já se parecia com seu crime antes de cometê-lo.
O fato de que um julgamento como esse seja possível diz algo sobre o funcionamento do poder punitivo: para reforçar sua legitimidade, o poder judicial recorre a um discurso de verdade com estatuto de cientificidade – a psiquiatria – para demonstrar uma loucura punível, que no entanto é mais uma avaliação moral do sujeito como anormal que outra coisa. O exame psiquiátrico é a tecnologia de saber-poder que permite essa produção da anormalidade, a qual será posta em evidência diante do crime. Marcelo pode ou não ter apertado o gatilho da arma que matou sua família e a si, mas isso já não é uma questão para o poder: é uma criança louca, e por isso culpada.

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Revista vexatória é proibida em São Paulo

Governador sanciona lei que impede humilhação de familiares em presídios, mas aplicação ainda é desafio

 O estado que concentra a maior população carcerária do Brasil acaba de proibir uma das mais violadoras práticas do sistema prisional brasileiro: a revista vexatória. A nova lei (15.552/14), aprovada pela Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) em julho, foi sancionada pelo governador Geraldo Alckmin e publicada hoje, dia 13, no Diário Oficial.

A decisão é uma vitória para familiares dos 190 mil presos do estado, que sofrem repetidas humilhações na entrada dos presídios nos dias de vista.

Com a nova lei, os estabelecimentos prisionais ficam proibidos de submeter os visitantes a procedimentos invasivos, como é o caso do desnudamento, dos repetidos agachamentos sobre um espelho e da inspeção anal e vaginal. O parágrafo único do artigo 1o afirma que “os procedimentos de revista dar-se-ão em razão da necessidade de segurança e serão realizados com respeito à dignidade humana”.

“A aprovação da lei é um grande avanço e, justamente por reconhecer que a revista vexatória é uma prática humilhante, deve ser imediatamente aplicada. Mas precisamos alertar que a lei por si só não basta, ela precisa ser concretizada no mundo real”, afirma Rafael Custódio, coordenador de Justiça da Conectas. Segundo o texto sancionado por Alckmin, o governo tem até 180 dias para regulamentar a nova norma através de um decreto.

Vetos

Os pontos negativos da lei aprovada ficam por conta de dois vetos do governador. O primeiro determinava que a proibição abrangeria manicômios judiciais e internação de menores, como é o caso da Fundação Casa. Com o veto, a revista vexatória fica impedida somente em ‘estabelecimentos prisionais’.

“A violação de familiares de adolescentes internados não é diferente da violação cometida contra familiares de presos”, critica Custódio. “Nada justifica o reconhecimento da violação de um grupo, mas não de outro. Esse veto viola o princípio constitucional da isonomia.”

O segundo veto retirou do texto parágrafo único impedia a revista mecânica e eletrônica de gestantes e pessoas portadoras de marca-passo. O texto original previa que visita poderia ser realizada após realização de procedimentos alternativos. A lei sancionada não explicita como essas pessoas poderão ingressar no estabelecimento prisional.

Outros estados

Estados e cidades que já aplicaram proibições totais ou parciais à revista vexatória não apresentaram aumento nos números de ocorrências relacionadas à segurança de seus presídios. Goiás, por exemplo, aplica a chamada “revista humanizada”, que proíbe a nudez. O Espírito Santo possui norma similar. Depois de decisão inédita do Tribunal de Justiça, o município de Joinville, em Santa Catarina, instalou scanners corporais em suas unidades. Recentemente, um juiz de Recife também proibiu a revista vexatória na cidade.

Outros estados já têm leis que restringem o procedimento, mas ainda não o aboliram totalmente. É o caso de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Paraíba.

Segundo dados coletados pela Rede de Justiça Criminal com base em documentos oficiais da Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo, apenas 3 em cada 10 mil revistas vexatórias resultam na apreensão de objetos proibidos. Ao longo de todo o período estudado pela Rede, nenhuma arma foi flagrada durante o procedimento.

Campanha nacional

A proibição da revista vexatória em São Paulo vem na esteira de um movimento nacional e internacional de repúdio. Em abril, uma campanha da Rede Justiça Criminal impulsionou a aprovação de um projeto de lei federal (7764/14) que acaba com a prática em todo o país. O texto já foi aprovado por unanimidade no Senado e aguarda votação na Câmara.

Ajude a acabar com essa violência: acesse www.fimdarevistavexatoria.org.br e assine a petição. 

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Por que as crianças francesas não têm Déficit de Atenção?

Como é que a epidemia do Déficit de Atenção, que tornou-se firmemente estabelecida em vários países do mundo, foi quase completamente desconsiderada com relação a crianças na França?

Nos Estados Unidos, pelo menos 9% das crianças em idade escolar foram diagnosticadas com TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade), e estão sendo tratadas com medicamentos. Na França, a percentagem de crianças diagnosticadas e medicadas para o TDAH é inferior a 0,5%. Como é que a epidemia de TDAH, que tornou-se firmemente estabelecida nos Estados Unidos, foi quase completamente desconsiderada com relação a crianças na França?
déficit atenção crianças
Déficit de Atenção em crianças francesas é inferior a 0,5% (Foto: Ilustração)
TDAH é um transtorno biológico-neurológico? Surpreendentemente, a resposta a esta pergunta depende do fato de você morar na França ou nos Estados Unidos. Nos Estados Unidos, os psiquiatras pediátricos consideram o TDAH como um distúrbio biológico, com causas biológicas. O tratamento de escolha também é biológico – medicamentos estimulantes psíquicos, tais como Ritalina e Adderall.
Os psiquiatras infantis franceses, por outro lado, vêem o TDAH como uma condição médica que tem causas psico-sociais e situacionais. Em vez de tratar os problemas de concentração e de comportamento com drogas, os médicos franceses preferem avaliar o problema subjacente que está causando o sofrimento da criança; não o cérebro da criança, mas o contexto social da criança. Eles, então, optam por tratar o problema do contexto social subjacente com psicoterapia ou aconselhamento familiar. Esta é uma maneira muito diferente de ver as coisas, comparada à tendência americana de atribuir todos os sintomas de uma disfunção biológica a um desequilíbrio químico no cérebro da criança.
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Os psiquiatras infantis franceses não usam o mesmo sistema de classificação de problemas emocionais infantis utilizado pelos psiquiatras americanos. Eles não usam o Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders ou DSM. De acordo com o sociólogo Manuel Vallee, a Federação Francesa de Psiquiatria desenvolveu um sistema de classificação alternativa, como uma resistência à influência do DSM-3. Esta alternativa foi a CFTMEA (Classification Française des Troubles Mentaux de L’Enfant et de L’Adolescent), lançado pela primeira vez em 1983, e atualizado em 1988 e 2000. O foco do CFTMEA está em identificar e tratar as causas psicossociais subjacentes aos sintomas das crianças, e não em encontrar os melhores bandaids farmacológicos para mascarar os sintomas.
Na medida em que os médicos franceses são bem sucedidos em encontrar e reparar o que estava errado no contexto social da criança, menos crianças se enquadram no diagnóstico de TDAH. Além disso, a definição de TDAH não é tão ampla quanto no sistema americano, que na minha opinião, tende a “patologizar” muito do que seria um comportamento normal da infância. O DSM não considera causas subjacentes. Dessa forma, leva os médicos a diagnosticarem como TDAH um número muito maior de crianças sintomáticas, e também os incentiva a tratar as crianças com produtos farmacêuticos.
A abordagem psico-social holística francesa também permite considerar causas nutricionais para sintomas do TDAH, especificamente o fato de o comportamento de algumas crianças se agravar após a ingestão de alimentos com corantes, certos conservantes, e / ou alérgenos. Os médicos que trabalham com crianças com problemas, para não mencionar os pais de muitas crianças com TDAH, estão bem conscientes de que as intervenções dietéticas às vezes podem ajudar. Nos Estados Unidos, o foco estrito no tratamento farmacológico do TDAH, no entanto, incentiva os médicos a ignorarem a influência dos fatores dietéticos sobre o comportamento das crianças.
E depois, claro, há muitas diferentes filosofias de educação infantil nos Estados Unidos e na França. Estas filosofias divergentes poderiam explicar por que as crianças francesas são geralmente mais bem comportadas do que as americanas. Pamela Druckerman destaca os estilos parentais divergentes em seu recente livro, Bringing up Bébé. Acredito que suas idéias são relevantes para a discussão, por que o número de crianças francesas diagnosticadas com TDAH, em nada parecem com os números que estamos vendo nos Estados Unidos.
A partir do momento que seus filhos nascem, os pais franceses oferecem um firme cadre – que significa “matriz” ou “estrutura”. Não é permitido, por exemplo, que as crianças tomem um lanche quando quiserem. As refeições são em quatro momentos específicos do dia. Crianças francesas aprendem a esperar pacientemente pelas refeições, em vez de comer salgadinhos, sempre que lhes apetecer. Os bebês franceses também se adequam aos limites estabelecidos pelos pais. Pais franceses deixam seus bebês chorando se não dormirem durante a noite, com a idade de quatro meses.
Os pais franceses, destaca Druckerman, amam seus filhos tanto quanto os pais americanos. Eles os levam às aulas de piano, à prática esportiva, e os incentivam a tirar o máximo de seus talentos. Mas os pais franceses têm uma filosofia diferente de disciplina. Limites aplicados de forma coerente, na visão francesa, fazem as crianças se sentirem seguras e protegidas. Limites claros, eles acreditam, fazem a criança se sentir mais feliz e mais segura, algo que é congruente com a minha própria experiência, como terapeuta e como mãe. Finalmente, os pais franceses acreditam que ouvir a palavra “não” resgata as crianças da “tirania de seus próprios desejos”. E a palmada, quando usada criteriosamente, não é considerada abuso na França.
Como terapeuta que trabalha com as crianças, faz todo o sentido para mim que as crianças francesas não precisem de medicamentos para controlar o seu comportamento, porque aprendem o auto-controle no início de suas vidas. As crianças crescem em famílias em que as regras são bem compreendidas, e a hierarquia familiar é clara e firme. Em famílias francesas, como descreve Druckerman, os pais estão firmemente no comando de seus filhos, enquanto que no estilo de família americana, a situação é muitas vezes o inverso.

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Consumo de Ritalina no Brasil cresce 775% em dez anos

Droga é usada no tratamento do transtorno de déficit de atenção e hiperatividade.

11/08/2014 | 09h16
Consumo de Ritalina no Brasil cresce 775% em dez anos  Emílio Pedroso/Agencia RBS
Na última década, a importação e a produção do medicamento também cresceram 373% no País Foto: Emílio Pedroso / Agencia RBS
Em dez anos, a importação e a produção de metilfenidato - mais conhecido como Ritalina, um de seus nomes comerciais - cresceram 373% no País. A maior disponibilidade do medicamento no mercado nacional impulsionou um aumento de 775% no consumo da droga, usada no tratamento do transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). Os dados são de pesquisa do Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).

O remédio é usado sobretudo em crianças e adolescentes, os mais afetados pelo transtorno. Para especialistas, a alta no uso do medicamento reflete maior conhecimento da doença e aumento de diagnósticos, mas também levanta o alerta de uso indevido da substância, até por pessoas saudáveis que buscam aumentar o rendimento em atividades intelectuais.

Em sua tese de doutorado pela UERJ, defendida em maio, a psicóloga Denise Barros compilou os dados dos relatórios anuais sobre substâncias psicotrópicas da Junta Internacional de Controle de Narcóticos, órgão vinculado às Nações Unidas. De acordo com o levantamento, o volume de metilfenidato importado pelo Brasil ou produzido em território nacional passou de 122 kg em 2003 para 578 kg em 2012, alta de 373%. A pesquisadora cruzou os dados da produção e importação e do estoque acumulado em cada ano, dado também disponível nos relatórios, para chegar aos prováveis índices anuais de consumo. De acordo com o levantamento, foram 94 kg consumidos em 2003 contra 875 kg em 2012, crescimento de 775%.

Dados mais recentes obtidos pelo jornal O Estado de S. Paulo na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) confirmam a tendência de alta. Segundo o órgão, o número de caixas de metilfenidato vendidas no Brasil passou de 2,1 milhões em 2010 para 2,6 milhões em 2013.

— Houve um aumento da divulgação da doença e do número de pessoas que passaram a ter acesso ao tratamento, mas há outro fator importante, que é uma maior exigência social de administrar a atenção — afirma a especialista

Ela lembra ainda que há casos de adultos sem o transtorno que tomam o metilfenidato para melhorar a concentração e o foco nos estudos.

—Isso é comum entre concurseiros, vestibulandos, estudantes de Medicina. Pouco se fala sobre isso no Brasil, mas nos Estados Unidos e em algumas partes da Europa, esse uso inadequado já é tratado como um problema de saúde pública — declara.

Diagnóstico

Para o psiquiatra infantil Rossano Cabral Lima, professor da UERJ, a alta no consumo é motivo de alerta porque o diagnóstico de TDAH nem sempre é acompanhado de uma investigação aprofundada das possíveis causas do comportamento incomum da criança.

— Apesar de a medicação ser importante em alguns casos, o diagnóstico rápido de TDAH e o tratamento medicamentoso parecem ter se tornado a solução mais rápida e fácil de vários problemas, sem que a origem deles seja analisada a fundo. Não se questiona se a inquietude da criança pode estar relacionada a alguma questão da escola, se é uma resposta a algo que ela não está sabendo lidar — diz o especialista. 

Presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), Antônio Geraldo da Silva, afirma que, apesar da alta no consumo, ainda há milhares de brasileiros com TDAH sem tratamento.

— Com o crescimento do acesso à medicação, estamos talvez começando a adequar a proporção de pessoas com o transtorno e pacientes tratados. Mas hoje, infelizmente, ainda temos subtratamento de TDAH — declarou o presidente da ABP

O especialista cita também um estudo publicado em 2012 na Revista Brasileira de Psiquiatria que apontou que apenas 19% dos brasileiros com TDAH fazem o tratamento com medicação. 
 
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