23 janeiro 2010

Nota sobre a reestruturação da Funai

21/01/2010 - Nota sobre a reestruturação da Funai

Manifesto de entidades de apoio e Organizações Indígenas
Nós, abaixo-assinados, tendo em consideração a edição do Decreto de reestruturação da Fundação Nacional do Índio (Funai) ocorrida em 28 de dezembro de 2009, e suas repercussões que motivaram a ocupação da sede do órgão em Brasília por várias delegações indígenas, viemos a público nos manifestar.
1 - O movimento indígena e seus aliados sempre defenderam a necessidade e importância da reestruturação do órgão indigenista, visando à readequação de sua estrutura institucional e quadro funcional às demandas dos povos indígenas, especialmente no tocante às reivindicações territoriais, assegurando a demarcação do passivo de terras indígenas e o monitoramento das distintas ações e políticas de governo voltadas aos povos indígenas, hoje dispersas em distintos ministérios. Com efeito, esperava-se que esta reestruturação fosse viabilizada desde 2003, quando o movimento indígena e seus aliados aguardaram com grande expectativa que o Governo Lula tornasse realidade a almejada Nova Política Indigenista anunciada em seu Programa de Governo.


2 – O movimento indígena e seus aliados, contudo, questionam a forma como a proposta de reestruturação foi trabalhada “intra-muros” na Funai, repetindo a tática do “fato consumado”, praticada pelo Governo em outras ocasiões. Como conseqüência, os povos e organizações indígenas se sentiram desrespeitados no seu direito à consulta livre, prévia e informada assegurada pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que já é lei no país. Isso deu margem a que setores corporativos do órgão, contrários a qualquer mudança que afete seus interesses pessoais e de grupo, se articulassem para tumultuar o processo.


3 - Faltou, de fato, um processo de diálogo com os povos e organizações indígenas nas distintas regiões que, como os fatos têm demonstrado, até o momento não se sentiram devidamente informados e esclarecidos sobre os impactos da reestruturação e as implicações e procedimentos de sua implementação. Os representantes indígenas e indigenistas na Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI) reiteraram, na última reunião da Comissão realizada no mês de dezembro de 2009, poucos dias antes da publicação do Decreto, a necessidade de diálogo, a respeito.
4 – Apresentar a grosso modo a proposta de reestruturação na CNPI sem possibilitar o debate democrático, como foi feito com as propostas do Estatuto dos Povos Indígenas ou do Projeto de Lei do Conselho de Política Indigenista, não pode ser caracterizado como consulta ou produto de deliberação desta instância.


5 – Face a este contexto é compreensível a reação das lideranças indígenas contra a publicação do Decreto, fazendo-se necessária, por parte do Governo, uma postura de acolhida às críticas, ajustando o decreto, nos casos onde houve falhas na percepção das realidades peculiares de cada povo ou região étnica, sem necessariamente mexer com o propósito fundamental da reestruturação: a adequação da Funai para o cumprimento de seu papel institucional na perspectiva de uma nova política indigenista, longe do indigenismo tutelar, autoritário, assistencialista e paternalista. Espera-se também que, na discussão do Regimento previsto no Decreto, as percepções e críticas acerca do Decreto sejam discutidas com os povos indígenas e incorporadas naquele diploma legal.

6 – É preciso ser suficientemente esclarecido o conteúdo do Decreto e, inclusive, como será efetivamente implementado nas distintas instâncias: coordenações técnicas locais, coordenações regionais e sede em Brasília, para superar temores, relacionadas, por exemplo, com o enfraquecimento do papel da Funai na regularização fundiária das terras indígenas ou com a falta de quadros especializados para cada área de atuação. Neste sentido, é preciso que, no processo de seleção dos novos servidores, a Funai priorize as especializações que reforcem seu papel na regularização fundiária das Terras Indígenas (antropólogos, ambientalistas, topógrafos etc.).


7 – Espera-se que a participação indígena, seja assegurada no acompanhamento da implementação da reestruturação, depois de devidamente adequada aos reais interesses dos povos e organizações indígenas.


8 - Dado que o Governo decretou este ato administrativo sem ter previsto suficientes espaços de diálogo com o movimento e os povos indígenas, cabe ao mesmo respeitar o direito de insatisfação e manifestação que a Constituição Federal assegura aos movimentos sociais, priorizando a via do diálogo e da negociação como prevê o novo Plano Nacional de Direitos Humanos em casos semelhantes.


9. Por fim, exortamos o Governo, com base na experiência gerada pelo Decreto de reestruturação da Funai, a assegurar aos povos indígenas o direito à consulta livre, prévia e informada, conforme assegura a Convenção 169 da OIT, sobre as distintas questões que os afeta. São eles, afinal, os primeiros interessados diretos.


10. Aos povos e organizações indígenas, manifestamos a nossa disposição de continuar vigilantes na defesa de seus direitos, tendo em consideração as suas reais necessidades e aspirações.


Brasília, 19 de janeiro de 2010.


Associação Nacional de Ação Indigenista – ANAI
Conselho Indigenista Missionário - CIMI
Centro de Trabalho Indigenista - CTI
Instituto de Estudos Socioeconômicos - INESC
Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo - APOINME
Articulação dos Povos Indígenas do Pantanal e Região - ARPIPAN
Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira - COIAB
http://www.cimi.org.br/?system=news&action=read&id=4383&eid=259

Nenhum comentário:

Postar um comentário