Nota de solidariedade a Dom Pedro
Casaldáliga
Ao se
aproximar a desintrusão da Terra Indígena Marãiwatsèdè, após mais de 20 anos de
invasão, quando os não indígenas estão para ser retirados desta área,
multiplicam-se as manifestações de fazendeiros, políticos e dos próprios meios
de comunicação contra a ação da justiça.
Neste
momento de desespero, uma das pessoas mais visadas pelos invasores e pelos que
os defendem é Dom Pedro Casaldáliga, bispo emérito de São Félix do Araguaia, a
quem estão querendo, irresponsável e inescrupulosamente, imputar a
responsabilidade pela demarcação da área Xavante nas terras do Posto da Mata.
As
entidades que assinam esta nota querem externar sua mais irrestrita
solidariedade a Dom Pedro. Desde o momento em que pisou este chão do Araguaia e
mais precisamente, desde a hora em que foi sagrado bispo da Prelazia de São
Félix do Araguaia, sua ação sempre se pautou na defesa dos interesses dos mais
pobres, os povos indígenas, os posseiros e os peões. Todos sabem que Dom Pedro
e a Prelazia sempre deram apoio a todas as ocupações de terra pelos posseiros e
sem terra e como estas ocupações foram o suporte que possibilitou a criação da
maior parte dos municípios da região.
Em relação à terra indígena Marãiwatsèdè, dos Xavante, os primeiros moradores da região nas décadas de 1930, 40 e 50 são testemunhas da presença dos indígenas na região e como eles perambulavam por toda ela. Foi com a chegada das empresas agropecuárias, na década de 1960, com apoio do governo militar, que a Suiá Missu se estabeleceu nas proximidades de uma das aldeias e até mesmo conseguiu o apoio do Serviço de Proteção ao Indio para se ver livre da presença dos indígenas. A imprensa nacional noticiou a retirada de 289 xavante da região os quais foram transportados em aviões da FAB, em 1966, para a aldeia de São Marcos, no município de Barra do Garças.
Em 1992,
a AGIP, empresa italiana que tinha comprado a Suiá Missu das mãos da família
Ometto, quis se desfazer destas terras. Por ocasião da ECO-92, sob pressão
inclusive internacional, a empresa destinou 165.000 hectares para os Xavante
que, durante todo este tempo, sonhavam em voltar à terra de onde tinham sido
arrancados. Imediatamente fazendeiros e políticos da região fizeram uma grande
campanha para ocupar a área que fora reservada aos Xavante, precisamente para
impedir que os mesmos retornassem. Já no dia 20 de junho de 1992, algumas áreas
tinham sido ocupadas e foi feita uma reunião no Posto da Mata, da qual
participaram políticos de São Félix do Araguaia e de Alto Boa Vista e também
havia repórteres. A reunião foi toda gravada. As falas deixam mais do que claro
que a invasão da área era exatamente para impedir a volta dos Xavante. “Se a
população achou por bem tomar conta dessa terra em vez de dá-la para os índios,
nós temos que dar esse respaldo para o povo” (José Antônio de Almeida –
Bau, prefeito de São Félix do Araguaia). “A finalidade dessa reunião é
tentarmos organizar mais os posseiros que estão dentro da área... Se for
colocar índio no seu habitat natural, tem que mandar índio lá para
Jacareacanga, ou Amazonas, ou Pará...” (Osmar Kalil – Mazim, candidato a
prefeito do Alto Boa Vista). “Nós ajudamos até todos os posseiros daqui
serem localizados... Chegou a um ponto, ou nós ou eles (os Xavante)
porque nós temos o direito... Dizer que aqui tem muito índio? Aqueles que estão
preocupados com os índios que tem que assentar. Tem um monte de país que não
tem índio. Pode levar a metade... Na Itália tem índio? Não, não tem! Leva! Leva
pra lá! Carrega pra lá! Agora, não vem jogar em nós, não... ( Filemon Costa
Limoeiro, à época funcionário do Fórum de São Félix do Araguaia)
A área
reservada aos Xavante foi toda ocupada por fazendeiros, políticos e
comerciantes. Muitos pequenos foram incentivados e apoiados a ocupar algumas
pequenas áreas para dar cobertura aos grandes. O governo da República, porém
estava agindo e logo, em 1993, declarou a área como Terra Indígena que foi demarcada
e, em 1998 homologada pelo presidente FHC. Só agora é que a justiça está
reconhecendo de maneira definitiva o direito maior dos índios. O que D. Pedro
sempre pediu, em relação a esta terra, foi que os pequenos que entraram
enganados, fossem assentados em outras terras da Reformas Agrária. Mas o que se
vê é que, ontem como hoje, os pequenos continuam sendo massa de manobra nas
mãos dos grandes e dos políticos na tentativa de não se garantir aos povos
indígenas um direito que lhes é reconhecido pela Constituição Brasileira.
Mais uma
vez, queremos manifestar nossa solidariedade a Dom Pedro e denunciar mais esta
mentira de parte daqueles que tentam eximir-se da sua responsabilidade sobre a
situação de sofrimento, tensão e ameaça de violência que eles mesmos criaram,
jogando esta responsabilidade sobre os ombros de nosso Bispo Emérito.
5 de
dezembro de 2012
Conselho
Indigenista Missionário – CIMI - Brasilia
Comissão
Pastoral da Terra – CPT - Goiânia
Escritório
de Direitos Humanos da Prelazia de São Félix do Araguaia – São Félix do
Araguaia
Associação
de Educação e Assistência Social Nossa Senhora da Assunção – ANSA – São Félix
do Araguaia
Instituto
Humana Raça Fêmina – Inhurafe – São Félix do Araguaia
Associação
Terra Viva – Porto Alegre do Norte
Associação
Alvorada – Vila Rica
Associação
de Artesanato Arte Nossa – São Félix do Araguaia
Grupo de
Pesquisa Movimentos Sociais e Educação - GPMSE - Cuiabá
Associação
Brasileira de Homeopatia Popular – ABHP - Cuiabá
Fórum de
Direitos Humanos e da Terra de Mato Grosso - FDHT - Cuiabá
Centro
Burnier Fé e Justiça – CBFJ - Cuiabá
Fórum
Matogrossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento – FORMAD - Cuiabá
Instituto
Caracol – ICARACOL - Cuiabá
Rede de
Educação Ambiental de Mato Grosso – REMTEA - Cuiabá
Serviço
Pastoral dos Migrantes- SPM
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