2012-11-30
Colombia:
Pronunciamento do Fórum Nacional de Comunicação IndígenaFNCI
Antecedentes
Mais
de 700 participantes entre autoridades tradicionais, organizações, processos,
redes, imprensa independente e teias de comunicações, nos encontramos aqui, no
território indígena do Conselho Regional Indígena do Cauca (CRIC) onde a mais
de 41 anos vem se desenvolvendo um processo de resistência, reconhecimento e
recomposição da identidade, assim como da unidade dos povos originários.
Reconhecemos que os processos presentes neste Mutirão da Palavra denominado
Fórum Nacional de Comunicação Indígena, somos parte das tantas dinâmicas
demarcadas no repúdio à celebração triunfalista dos 500 anos de invasão
estrangeira e de 200 anos de frustradas buscas de independência que os Estados
da chamada América estão promovendo para poder legitimar a continuidade do
intervencionismo imperial.
Neste
mesmo território se desenvolveu a Primeira Cúpula Continental de Comunicações
de Abya Yala em 2010, onde, entre outros compromissos, nos propusemos a
preparar a II Cúpula Continental a realizar-se no México em 2013, a partir da
formação de uma comissão de preparação e uma agenda que promova reuniões,
oficinas, foros e seminários para socializar os compromissos e tarefas ali
acordadas. A partir dessa perspectiva se concretiza o Fórum Nacional de
Comunicação Indígena no qual hoje nos reunimos.
Também,
se tem desenvolvido outros eventos igualmente importantes no continente de Abya
Yala, entre estes o Fórum sobre Política Pública Internacional no marco do XI
Festival de Cinema e Vídeo dos Povos Indígenas em Bogotá, e o Parlamento de
Comunicação Indígena, na Argentina.
Hoje
o tema das novas Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) tem se ampliado
em todo o mundo, onde o direito à liberdade de imprensa, especialmente o
direito à informação, desaparecem do cenário da responsabilidade dos Estados, resultando
mais dramático quando o que se refere aos direitos de comunicação dos povos
sequer é levado em conota nos desenvolvimentos legislativos desses países.
Por
outro lado, direitos fundamentais como o direito à vida, à identidade, ao
território e à saúde e educação tem sido convertidos em artigos valiosos,
sujeitos às regras do mercado. É evidente que o processo de invasão e expansão
do poder, agora chamado modelo neoliberal, continua, gerando iniciativas
políticas de tomada de poder, umas dentro dos processos eleitorais e outras
pela via das armas. Este último tem produzido muitas vítimas, especialmente em
territórios indígenas da nação colombiana.
A
Comunicação Indígena
Declaramos
como princípios que orientam nossa Política de Comunicação os seguintes:
Cosmovisão
e relação com a Mãe Terra.
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Resistência
para consolidar nossos processos autônomos. Consolidar os processos de
informação, educação, reflexão, decisão e ação para entender a agressão e
defender a vida. Usar estrategicamente as formas de comunicação próprias e os
meios de comunicação apropriados para conscientizarmos e mobilizarmos por meio das
comunidades e redes de povos através de mutirões de pensamento e ação para
acompanharmos o caminho da palavra e na defesa do território coletivo com os
povos.
Tecidos
e redes de comunicação indígenas e populares.
O
valor da palavra e o pensamento que permitam pensar e consequentemente atuar
para comunicar com nossos princípios organizativos. Comunicar criticamente a
palavra do povo para o povo, não para aprofundar contradições, mas para
reconhecê-las e superá-las na comunidade.
Sob
estes princípios, este Mutirão da Palavra reafirma que a comunicação é integral
para os povos indígenas, presente em todos os âmbitos do território, por isto é
fundamental para nossas famílias, comunidades, processos organizativos,
resistências e Projetos de Vida. Nossa comunicação natural nos identifica como
seres coletivos, porque sempre estamos trocando, dialogando, sentindo,
pensando, sonhando e expressando em comunidade. Tem como fundamento uma ética e
uma espiritualidade onde os conteúdos, os sentimentos e os valores são
essenciais para a vida e a convivência entre os seres. Por isso para os povos
indígenas é fundamental a relação com os espíritos, com a água, com o fogo, com
o vento, com as plantas, com os animais e com todos os filhos de nossa Mãe Terra.
Da mesma forma como quando recorremos aos nossos territórios ancestrais, quando
escutamos, quando nos harmonizamos com nossos guias espirituais, quando
caminhamos na palavra dos povos na defesa da vida e do território.
Ameaças
que pairam sobre nós
Tudo
o que se tece em torno de nossos espaços de comunicação são saberes para
defender a vida. Saberes ameaçados por um projeto dominante, por um modelo
econômico conquistador e transnacional de cobiça que através de múltiplas
estratégias converte a nossa Mãe Terra em negócio e mercantiliza a palavra.
Um
modelo de agressão que insiste em tentar romper nossos modos de vida e nossas
resistências. Um projeto de morte que busca acumular e converter nossa Mãe
Terra em mercadoria e usa diversas estratégias de submissão. Por isso sofremos
o terror, a legislação de desapossamento, a propaganda ideológica e a cooptação
que provoca o deslocamento de nossos territórios, que mostra seu cruento rosto
cotidiano de massacres, assassinatos, sequestros, desaparecimentos e constantes
violações de nossos direitos, cercando-nos e invadindo-nos culturalmente,
promovendo o nosso desenraizamento cultural e buscando deslegitimar nossas
lutas e debilitar nossos processos políticos organizativos.
Nossos
desafios e caminhos
A
partir deste espaço legítimo reafirmamos nossa vontade e compromisso de
fortalecer nossos processos de resistência em defesa do território, a partir
das dinâmicas próprias de cada povo e/ou organizações para iniciar diálogos com
os governos e seguir tecendo entre povos e processos.
Trabalhar
pelo fortalecimento de processos autônomos de controle territorial em nossas comunidades,
pelas consultas prévias autônomas livres e informadas para decidir em nosso
território.
Formar
escolas e redes de comunicação para a defesa de nossos processos e fazer visíveis
nossas lutas, as constantes mobilizações e ações de fato contra os megaprojetos
para defender o território, a vida e a autonomia para caminhar dignamente com
nossos povos e consolidar nossos Projetos de Vida.
Propostas
gerais
Exigimos
deter o rumo do modelo capitalista dominante que nos leva ao suicídio no afã de
converter tudo em lixo e cobiça. Ser indígenas, originários, da terra, e
permanecer como povos com sabedoria, justiça e propostas a partir das raízes,
para uma liberdade com harmonia.
Sobre
a situação geral dos povos indígenas na Colômbia
O
Fórum Nacional de Comunicação Indígena exige que se respeitem nossos Projetos
de Vida e nossas propostas alternativas ao projeto de morte. Nós, homens e
mulheres, sabemos que convertem-nos em vítimas de despojos e que usam toda a
política estatal, o modelo econômico e o conflito armado par nos roubar. Assim,
conclamamos a todos os atores da guerra ao respeito à vida, ao território, ao
direito internacional humanitário, em particular à garantia da vida digna e ao
exercício da liberdade de imprensa e expressão através dos meios de informação
e comunicação indígenas.
No
atual processo de diálogo governo-guerrilha exigimos a plena garantia de que os
assuntos que afetam a população civil, em especial aos povos indígenas, sejam
tratados diretamente em espaços próprios das organizações civis, e neste
caminho seguimos empenhados em exigir a paz para nossos povos, que não é outra
coisa que a liberdade e autonomia de nossos territórios.
Sobre
a política de Comunicação
Reafirmamos
o caminhar da palavra a partir dos povos e regiões com o compromisso de
fortalecer os processos comunicativos próprios nos níveis local, regional e
nacional na perspectiva de articular, teias, redes e alianças entre povos e
processos de comunicação indígena.
Consolidação
de redes indígenas de caráter regional, nacional e internacional com outros
setores sociais para a visibilidade e impulso de ações e campanhas em defesa
dos territórios e da vida, e das potencialidades dos povos indígenas, e contra
a discriminação, a violência e a guerra.
Exigimos
uma política pública diferenciada entendida no sentido de que deve respeitar a
construção normativa e autônoma dos povos indígenas, de acordo com suas
características territoriais, políticas, sociais e culturais, gerando e
garantindo os recursos, especialmente para a implementação e execução dos
processos e meios de comunicação próprios.
Da
mesma forma é imperativo que o estado acorde com os povos indígenas campanhas
de reparação e dignificação histórica dos povos indígenas do continente.
Sobre a Segunda Cúpula Continental de Comunicação
Reafirmamos
nosso compromisso de participar e contribuir para o êxito da segunda Cúpula
Continental de Comunicação Indígena de Abya Yala, a se realizar em Oaxaca,
México, em outubro de 2013. A fim de fortalecer os laços de comunicação entre
todos os povos do continente para construir e desenvolver uma agenda comum que
articule e potencie nossos esforços continentais, com o objetivo de avançar no
exercício do direito à comunicação, como expressão da autodeterminação de
nossos povos, assim como de um plano de liberação da palavra.
Nós,
mulheres e homens participantes deste Mutirão da Palavra assumimos e ficamos
comprometidos com as indicações surgidas na reflexão com a orientação indicada
nas conclusões finais. O documento geral, onde se explicitam os termos e a
orientação para a construção de uma política pública será avaliado
proximamente, com delegados dos diferentes povos, onde se definirão e
apresentarão as linhas gerais a exigir para que o Estado garanta sua
aplicabilidade através dos espaços de concertação próprios e de realização
institucional que vêm sendo construídos a partir das regiões e processos
organizativos do país.
Finalmente
invocamos a nossas autoridades indígenas, autoridades tradicionais e processos
organizativos a que nos comprometamos a continuar assumindo com decisão o
caminhar da palavra, e nesse sentido a compartilhar, discutir e difundir os
resultados gerais deste fórum.
Popayán, Colômbia, 30 de novembro de 2012
(* Versión final, corregida el 2/12/2012)
Tradução
para o português de Rosane Lacerda
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