Consumo de
drogas
(* ) João Baptista
Herkenhoff
Fui
questionado por uma inteligente jornalista sobre uma lei, em andamento no
Congresso, que excluirá o consumo de drogas do rol de crimes.
A
Comissão de Juristas, que está elaborando projeto de reforma do Código Penal,
aprovou a descriminalização do uso de drogas. As pessoas que forem flagradas
com pequenas quantidades de entorpecentes para uso próprio (consumo para um
período de cinco dias) não poderão mais ser presas. Esta proposta me parece
tímida neste ponto em que limita a posse lícita para uma estimativa de cinco
dias. Melhor seria deixar este pormenor a critério do juiz, pelo motivo que
será explicado adiante.
Ser
hoje inquirido sobre a conveniência ou inconveniência de descriminalizar o
porte e o uso da maconha e outras drogas me dá a sensação de um mergulho no
túnel do tempo, de uma volta a passado longínquo.
Em
1976, em pleno regime militar, logo após a edição, pela ditadura, da Lei
6368/76, manifestei-me contra a inovação infeliz. Eu era então juiz em plena
atividade.
Os
jornais da época registraram meu protesto (discretamente porque vigorava a
censura). Nos cartórios estão minhas sentenças, encontrando sempre caminhos
hermenêuticos para absolver os usuários de droga. Mesmo a questão da quantidade
de entorpecente, em poder do viciado, é relativa. Lembro-me de um acusado que
declarou manter em sua residência um estoque para uso prolongado, a fim de não
ser explorado no preço. Contudo só fumava nos fins de semana. Constatei que ele
falava a verdade. Convém, sobretudo aos jornalistas, pesquisar esses documentos
com muito zelo porque um povo, uma comunidade, as pessoas precisam de ter
História. Povo sem história é povo sem identidade, sem referencial, é povo que
confunde algoz e vítima, perseguido e perseguidor.
O
consumo de tóxicos não era crime antes. Crime sempre foi o tráfico. A
capitulação do consumo como crime teve objetivo político. Permitiu que muitos
jovens fossem presos com base em flagrante forjado, para perseguir aqueles que
não rezavam pela cartilha do regime de exceção.
Punir
alguém que consome droga só aumenta o sofrimento da pessoa. Em primeiro lugar,
lança sobre ela um estigma: maconheiro. O processo penal só dificultará o apoio
que os drogados precisam receber da sociedade, da família, das instituições.
Suprimir
a capitulação penal que massacra o usuário de drogas merece aplausos. Apenas é
um conserto na lei que se faz com muito atraso, depois de ter causado males
imensos a muita gente. Mas, de qualquer forma, melhor tarde do que nunca.
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(*) João
Baptista Herkenhoff é professor da Faculdade Estácio de Sá do Espírito Santo e
escritor. Foi um dos fundadores e primeiro presidente da Comissão de Justiça e
Paz da Arquidiocese de Vitória. É autor, dentre outros livros, de "Como aplicar o Direito" (Forense, Rio de Janeiro).
É
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transmissão de pessoa para pessoa.
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