04 novembro 2010

Kosovo: Europa devolve penúria aos Romaní

Europa Ocidental deve deter as deportações e prestar assistência aos Romaní forçados a regressar a Kosovo

Municipio de Kamenika/Kamenice. Milana Stojanovic é uma
deslocada interna Romaní, originária de Kolanski Most
 (no mesmo município). Sua casa foi incendiada por pessoas
pertencentes à etnia albanesa em 1999, reconstruída em 2000
 pelo pessoal do PNUD e incendiada novamente para impedir
o regresso da família
© 2009 Andrew Testa/Panos para Human Rights Watch
 (Pristina, 28 de outubro de 2010) – Os Romaní e os grupos minoritários afins deportados da Europa Ocidental para o Kosovo enfrentam a discriminação e privações graves equivalentes a abusos contra os direitos humanos, assinalou o Human Rights Watch em um informe publicado hoje.


O informe de 77 páginas "Rights Displaced: Forced Returns of Roma, Ashkali and Egyptians from Western Europe to Kosovo", documenta os graves problemas de direitos humanos dos que foram de Kosovo para a Europa Ocidental e posteriormente foram enviados de volta. Experimentam problemas para obter documentos de identidade e recuperar a posse de quaisquer de suas propriedades. Também têm dificuldades de acesso a moradia, atenção sanitária, emprego e serviços de bem-estar social. Muitos acabam em lugares distantes de seus familiares. As deportações são especialmente duras para as crianças, poucas das quais continuam sua escolarização devido à falta de domínio do idioma, às diferenças nos programas escolares e à pobreza.

“A Europa está enviando as pessoas mais vulneráveis de Kosovo de regresso à discriminação, à exclusão, à pobreza e ao desabrigo”, assinalou Wanda Troszczynska-van Genderen, pesquisadora sobre os Balcans Ocidentais de Human Rights Wacht. “Se os líderes europeus planejam seriamente melhorar a terrível situação dos Romaní, dos Ashkalí e dos Egípcios, deveriam suspender as deportações para Kosovo e garantir uma assistência adequada para os que já foram deportados”, acrescentou.

Cerca de 50 mil Romaní, a maioria sérvio-falantes e duas minorias albano-falantes (os Ashkalí e os Egípcios, que afirmam ser originários do Antigo Egito), foram deportados para Kosovo desde 1999. As cifras parecem destinadas a crescer, já que até 12 mil pessoas são alvo da deportação somente na Alemanha. A falta de assistência de cooperantes internacionais e do Governo do Kosovo às pessoas deportadas resulta que a responsabilidade pela ajuda aos que chegam ao Kosovo recaia sobre as próprias comunidades kosovares de Romaní, Ashkalí e Egípcios, a maioria das quais já vivem em terríveis condições de pobreza.

Os Romaní, Ashkalí e Egípcios de Kosovo constituem historicamente sua minoria mais pobre e marginalizada em termos econômicos, políticos e sociais. Nos últimos anos, muitos foram deslocados pela guerra, por conflitos étnicos, pela pobreza extrema e pela instabilidade política. Sua presença foi reduzida de mais de 200 mil antes da guerra de 1999, para os 38 mil atuais. Os Romaní frequentemente são objeto de ataques violentos e do desprezo de alguns albanokosovares (o grupo étnico mais numeroso do Kosovo) que os consideram “colaboradores” da população minoritária de origem sérvia. Alguns obtiveram a condição de refugiados no estrangeiro, e outros se encontram sob o amparo de mecanismos temporários de proteção. Durante sua estada na Europa Ocidental, os Romaní, Ashkalí e Egípcios vivem em condições incomparavelmente melhores que as de Kosovo. Seus filhos, muitos dos quais nascidos no estrangeiro, aprendem o idioma e adotam a cultura e estilo de vida dos países de acolhida na Europa Ocidental. Tendem a crescer sem falar as línguas maternas de seus pais.

“A Europa está enviando as pessoas mais vulneráveis do Kosovo
de volta à discriminação, exclusão, pobreza e desabrigo.
Se os líderes europeus planejam seriamente melhorar a terrível
situação dos Romaní, os ashalí e os egípcios, deveriam
suspender as deportações para o Kosovo e garantir
uma assistência adequada para os que já foram deportados.”
Wanda Troszczynska-van Genderen, pesquisadora sobre
os Balcans Ocidentais da Human Rights Watch.

Contudo, alguns dos que migram para outros países não chegam a obter refúgio ou vêem vencer o prazo de sua proteção temporária, o que os expõe à deportação. Alguns dos deportados não podem obter documentos de identidade de Kosovo e carecem de documentação yugoslava ou sérvia que estabeleça sua residência prévia na região, o que os converte em apátridas de fato, com frequência durantes períodos prolongados.

Em abril o Secretário-Geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, criticou as deportações e afirmou que elas desestabilizam a situação de segurança no Kosovo e agravam os problemas que enfrentam estes grupos minoritários no país. O comissário de Direitos Humanos da União Européia, Thomas Hammarberg, e o Parlamento Europeu pediram também que se suspendam as devoluções durante este ano, até que melhorem as condições.

As diretrizes do Alto-Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR) instam aos países a não deportar os Romaní, e assinalam que só se pode devolver os Ashkalí e Egípcios após uma avaliação individual do risco e por etapas, tendo em conta a capacidade limitada de Kosovo para os acolher.

“Existe um consenso crescente de que estas deportações estão pondo em risco os Romaní, Ashkalí e Egípcios, e piorando as condições de vida dos que já se encontram no Kosovo”, assinalou Troszczynska-van Genderen. "As responsabilidades dos governos da União Européia não se circunscrevem a suas fronteiras. Tanto eles quanto outros cooperantes têm que centrar-se na melhoria das condições sobre o terreno, em lugar de enviar pessoas de volta a uma situação desesperada”, acrescentou.

Desde 2009 o Governo do Kosovo tem firmado acordos de readmissão com Alemanha, Bélgica, França, Suíça e Noruega, e está negociando acordos com outros países. Kosovo está muito interessado em estreitar suas relações com a União Européia e outros países

europeus. Estes acordos, e a ausência de controles do Kosovo antes dos retornos forçados, abrem a possibilidade de um número ainda maior de deportações, geram um risco real de abusos contra os direitos humanos e agravam as condições de crise para os deportados, seus familiares e a comunidade kosovar en geral.

O informe observa que o Governo Kosovar contribui para os problemas dos Romaní e outras pessoas expulsas ao não insistir em que os governos que os deportam ajudem a criar condições adequadas para eles no Kosovo. O Kosovo tampouco tem adotado medidas adequadas para regular os retornos e a ajudar aos deportados a reintegrar-se na sociedade.

Não se tem levado a cabo uma estratégia criada em 2007 para reintegrar os deportados à força e outros retornados, e o Governo Kosovar tem avançado muito pouco em sua estratégia mais ampla, desenhada também em 2007, para melhorar os direitos de todas as comunidades Romaní, Ashkalí e Egipcias.

O informe recomeda:

a) Uma moratória imediata dos regressos forçados até que melhorem as condições;
b) Medidas urgentes para prestar assistência aos que têm sido deportados;
c) Plena implementação das estratégias do Governo do Kosovo para a integração dos retornados forçados e a melhora das condições de vida em todas as comunidades Romaní, Ashkalí e Egipcias.

As deportações da Alemanha têm resultado especialmente controvertidas e os partidos de oposição e as organizações não-governamentais têm condenado recentemente esta política no seio do Parlamento Alemão.

Uma mudança recente na política de deportações no estado alemão da Renânia do Norte-Westfalia, onde reside ao menos 40 por cento dos Romaní, Ashkalí e Egipcios kosovares do país, indica que a reforma é possível. Em setembro, o Ministério do Interior daquele estado emitiu um decreto que, ainda que não chegue a suspender totalmente as deportações, reconhece a necessidade de proteção especial aos grupos kosovares, requer avaliações individuais antes da expulsão e recomenda que não se deporte crianças em idade escolar.

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Matéria da Human Rights Watch em:  http://www.hrw.org/es/news/2010/10/27/kosovo-europa-devuelve-los-roman-es-situaciones-de-penuria

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