08 dezembro 2012

Colômbia: povos indígenas reivindicam políticas públicas específicas na área do Direito à Comunicação


2012-11-30
Colombia: Pronunciamento do Fórum Nacional de Comunicação Indígena

FNCI


Antecedentes
Mais de 700 participantes entre autoridades tradicionais, organizações, processos, redes, imprensa independente e teias de comunicações, nos encontramos aqui, no território indígena do Conselho Regional Indígena do Cauca (CRIC) onde a mais de 41 anos vem se desenvolvendo um processo de resistência, reconhecimento e recomposição da identidade, assim como da unidade dos povos originários. Reconhecemos que os processos presentes neste Mutirão da Palavra denominado Fórum Nacional de Comunicação Indígena, somos parte das tantas dinâmicas demarcadas no repúdio à celebração triunfalista dos 500 anos de invasão estrangeira e de 200 anos de frustradas buscas de independência que os Estados da chamada América estão promovendo para poder legitimar a continuidade do intervencionismo imperial.
Neste mesmo território se desenvolveu a Primeira Cúpula Continental de Comunicações de Abya Yala em 2010, onde, entre outros compromissos, nos propusemos a preparar a II Cúpula Continental a realizar-se no México em 2013, a partir da formação de uma comissão de preparação e uma agenda que promova reuniões, oficinas, foros e seminários para socializar os compromissos e tarefas ali acordadas. A partir dessa perspectiva se concretiza o Fórum Nacional de Comunicação Indígena no qual hoje nos reunimos.


Também, se tem desenvolvido outros eventos igualmente importantes no continente de Abya Yala, entre estes o Fórum sobre Política Pública Internacional no marco do XI Festival de Cinema e Vídeo dos Povos Indígenas em Bogotá, e o Parlamento de Comunicação Indígena, na Argentina.
Hoje o tema das novas Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) tem se ampliado em todo o mundo, onde o direito à liberdade de imprensa, especialmente o direito à informação, desaparecem do cenário da responsabilidade dos Estados, resultando mais dramático quando o que se refere aos direitos de comunicação dos povos sequer é levado em conota nos desenvolvimentos legislativos desses países.
Por outro lado, direitos fundamentais como o direito à vida, à identidade, ao território e à saúde e educação tem sido convertidos em artigos valiosos, sujeitos às regras do mercado. É evidente que o processo de invasão e expansão do poder, agora chamado modelo neoliberal, continua, gerando iniciativas políticas de tomada de poder, umas dentro dos processos eleitorais e outras pela via das armas. Este último tem produzido muitas vítimas, especialmente em territórios indígenas da nação colombiana.
A Comunicação Indígena
Declaramos como princípios que orientam nossa Política de Comunicação os seguintes:

Cosmovisão e relação com a Mãe Terra.
Autonomia de nossos processos de comunicação baseados em nossa Lei de origem e espiritualidade. Fortalecer comunicativamente a autoridade, a unidade, a terra e a cultura a partir do movimento indígena. Comunicar a partir de nossa própria espiritualidade, liberar o território do imaginário e descolonizar nossa palavra e ação para seguir sendo como os seres da Mãe Terra.
Resistência para consolidar nossos processos autônomos. Consolidar os processos de informação, educação, reflexão, decisão e ação para entender a agressão e defender a vida. Usar estrategicamente as formas de comunicação próprias e os meios de comunicação apropriados para conscientizarmos e mobilizarmos por meio das comunidades e redes de povos através de mutirões de pensamento e ação para acompanharmos o caminho da palavra e na defesa do território coletivo com os povos.

Tecidos e redes de comunicação indígenas e populares.
O valor da palavra e o pensamento que permitam pensar e consequentemente atuar para comunicar com nossos princípios organizativos. Comunicar criticamente a palavra do povo para o povo, não para aprofundar contradições, mas para reconhecê-las e superá-las na comunidade.
Sob estes princípios, este Mutirão da Palavra reafirma que a comunicação é integral para os povos indígenas, presente em todos os âmbitos do território, por isto é fundamental para nossas famílias, comunidades, processos organizativos, resistências e Projetos de Vida. Nossa comunicação natural nos identifica como seres coletivos, porque sempre estamos trocando, dialogando, sentindo, pensando, sonhando e expressando em comunidade. Tem como fundamento uma ética e uma espiritualidade onde os conteúdos, os sentimentos e os valores são essenciais para a vida e a convivência entre os seres. Por isso para os povos indígenas é fundamental a relação com os espíritos, com a água, com o fogo, com o vento, com as plantas, com os animais e com todos os filhos de nossa Mãe Terra. Da mesma forma como quando recorremos aos nossos territórios ancestrais, quando escutamos, quando nos harmonizamos com nossos guias espirituais, quando caminhamos na palavra dos povos na defesa da vida e do território.

Ameaças que pairam sobre nós
Tudo o que se tece em torno de nossos espaços de comunicação são saberes para defender a vida. Saberes ameaçados por um projeto dominante, por um modelo econômico conquistador e transnacional de cobiça que através de múltiplas estratégias converte a nossa Mãe Terra em negócio e mercantiliza a palavra.
Um modelo de agressão que insiste em tentar romper nossos modos de vida e nossas resistências. Um projeto de morte que busca acumular e converter nossa Mãe Terra em mercadoria e usa diversas estratégias de submissão. Por isso sofremos o terror, a legislação de desapossamento, a propaganda ideológica e a cooptação que provoca o deslocamento de nossos territórios, que mostra seu cruento rosto cotidiano de massacres, assassinatos, sequestros, desaparecimentos e constantes violações de nossos direitos, cercando-nos e invadindo-nos culturalmente, promovendo o nosso desenraizamento cultural e buscando deslegitimar nossas lutas e debilitar nossos processos políticos organizativos.
Nossos desafios e caminhos
A partir deste espaço legítimo reafirmamos nossa vontade e compromisso de fortalecer nossos processos de resistência em defesa do território, a partir das dinâmicas próprias de cada povo e/ou organizações para iniciar diálogos com os governos e seguir tecendo entre povos e processos.
Trabalhar pelo fortalecimento de processos autônomos de controle territorial em nossas comunidades, pelas consultas prévias autônomas livres e informadas para decidir em nosso território.
Formar escolas e redes de comunicação para a defesa de nossos processos e fazer visíveis nossas lutas, as constantes mobilizações e ações de fato contra os megaprojetos para defender o território, a vida e a autonomia para caminhar dignamente com nossos povos e consolidar nossos Projetos de Vida.

Propostas gerais
Exigimos deter o rumo do modelo capitalista dominante que nos leva ao suicídio no afã de converter tudo em lixo e cobiça. Ser indígenas, originários, da terra, e permanecer como povos com sabedoria, justiça e propostas a partir das raízes, para uma liberdade com harmonia.

Sobre a situação geral dos povos indígenas na Colômbia
O Fórum Nacional de Comunicação Indígena exige que se respeitem nossos Projetos de Vida e nossas propostas alternativas ao projeto de morte. Nós, homens e mulheres, sabemos que convertem-nos em vítimas de despojos e que usam toda a política estatal, o modelo econômico e o conflito armado par nos roubar. Assim, conclamamos a todos os atores da guerra ao respeito à vida, ao território, ao direito internacional humanitário, em particular à garantia da vida digna e ao exercício da liberdade de imprensa e expressão através dos meios de informação e comunicação indígenas.
No atual processo de diálogo governo-guerrilha exigimos a plena garantia de que os assuntos que afetam a população civil, em especial aos povos indígenas, sejam tratados diretamente em espaços próprios das organizações civis, e neste caminho seguimos empenhados em exigir a paz para nossos povos, que não é outra coisa que a liberdade e autonomia de nossos territórios.

Sobre a política de Comunicação
Reafirmamos o caminhar da palavra a partir dos povos e regiões com o compromisso de fortalecer os processos comunicativos próprios nos níveis local, regional e nacional na perspectiva de articular, teias, redes e alianças entre povos e processos de comunicação indígena.
Consolidação de redes indígenas de caráter regional, nacional e internacional com outros setores sociais para a visibilidade e impulso de ações e campanhas em defesa dos territórios e da vida, e das potencialidades dos povos indígenas, e contra a discriminação, a violência e a guerra.
Exigimos uma política pública diferenciada entendida no sentido de que deve respeitar a construção normativa e autônoma dos povos indígenas, de acordo com suas características territoriais, políticas, sociais e culturais, gerando e garantindo os recursos, especialmente para a implementação e execução dos processos e meios de comunicação próprios.
Da mesma forma é imperativo que o estado acorde com os povos indígenas campanhas de reparação e dignificação histórica dos povos indígenas do continente.

Sobre a Segunda Cúpula Continental de Comunicação

Reafirmamos nosso compromisso de participar e contribuir para o êxito da segunda Cúpula Continental de Comunicação Indígena de Abya Yala, a se realizar em Oaxaca, México, em outubro de 2013. A fim de fortalecer os laços de comunicação entre todos os povos do continente para construir e desenvolver uma agenda comum que articule e potencie nossos esforços continentais, com o objetivo de avançar no exercício do direito à comunicação, como expressão da autodeterminação de nossos povos, assim como de um plano de liberação da palavra.
Nós, mulheres e homens participantes deste Mutirão da Palavra assumimos e ficamos comprometidos com as indicações surgidas na reflexão com a orientação indicada nas conclusões finais. O documento geral, onde se explicitam os termos e a orientação para a construção de uma política pública será avaliado proximamente, com delegados dos diferentes povos, onde se definirão e apresentarão as linhas gerais a exigir para que o Estado garanta sua aplicabilidade através dos espaços de concertação próprios e de realização institucional que vêm sendo construídos a partir das regiões e processos organizativos do país.
Finalmente invocamos a nossas autoridades indígenas, autoridades tradicionais e processos organizativos a que nos comprometamos a continuar assumindo com decisão o caminhar da palavra, e nesse sentido a compartilhar, discutir e difundir os resultados gerais deste fórum.
Popayán, Colômbia, 30 de novembro de 2012
(* Versión final, corregida el 2/12/2012)

Tradução para o português de Rosane Lacerda

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